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5.2 USOS E LIMITAÇÕES DAS ESTIMATIVAS DE INDICADORES

Nas últimas décadas, os sistemas de informação e outras fontes de dados de saúde foram bastante aprimorados na maioria dos países. Ainda assim, devido a lacunas nos dados e problemas nas mensurações, é preciso fazer estimativas de indicadores de saúde com diferentes métodos matemáticos e estatísticos. Algumas situações comuns justificam o uso de estimativas dos indicadores da saúde das populações:

  • Ausência total de sistemas de informação e outras de fontes de dados para calcular indicadores básicos de eventos vitais e outra informação de saúde essencial para a gestão de saúde.
  • Ausência de dados populacionais ou ausência de contagem populacional nos períodos intercensitários ou em anos posteriores ao último censo (apesar de censos periódicos).
  • Lacunas de dados de saúde por problemas de validade e cobertura em alguns pontos no tempo ou áreas geográficas por capacidade técnica limitada, mudança na priorização política ou falta sustentabilidade financeira dos sistemas de informação em saúde.
  • Existência de dados e indicadores de saúde adequados, porém que são obtidos de estudos com amostras probabilísticas (observação de parte de um todo) que requerem a inclusão de variação amostral por processos de estimativa (inferência estatística).
  • Necessidade de indicadores de interesse para os organismos internacionais para fins de comparação e monitoramento dos países, bem como a produção de estimativas para as principais regiões do mundo, que englobam países muito heterogêneos em termos de qualidade e cobertura da informação em saúde (1).

É preciso ter cautela ao realizar estimativas por métodos indiretos para um determinado país a fim de facilitar que os indicadores globais calculados pelos organismos internacionais sejam compatíveis ao nível transnacional. Este é um assunto que suscita amplo debate (1, 2).

É consenso que os dados diretos devem ser, sempre que possível, valorizados e avaliados de forma contínua. O uso habitual de dados diretos gera oportunidades para a melhoria das fontes de dados. O uso indiscriminado de indicadores estimados pode comprometer a autenticidade dos dados e a informação que se originam diretamente dos sistemas nacionais de informação em saúde. Uma consequência seria a designação de recursos para melhorar os sistemas de informação em saúde, sobretudo nos países cujos recursos para a saúde são escassos.

Vários métodos de estimativa indireta (de dados demográficos ou outros) não escapam à inexatidão. Os métodos têm exatidão limitada em certas circunstâncias, como quando os dados nacionais estão incompletos ou raramente estão disponíveis. Contudo, é exatamente nestas situações que se faz necessário o cálculo de estimativas de indicadores de saúde. Para contornar problema de falta de disponibilidade de dados, às vezes são usados dados imputados a fim de gerar os dados necessários para fazer estimativas indiretas. A limitação inerente a esta imputação, como a baixa representatividade da diversidade de um país, a presença de erro aleatório não conhecido e a possível existência de erros sistemáticos relevantes, são subestimados (2). Esses erros podem comprometer sobremaneira a exatidão das estimativas indiretas, sem necessariamente superar a limitação da qualidade dos dados diretos. Outro ponto importante é a limitação da maioria das técnicas indiretas de captar corretamente mudanças significativas nos indicadores que estão sendo calculados. Um exemplo é a queda brusca da taxa de fecundidade no Brasil e a limitação das técnicas de projeção populacional usadas pelo governo para explicar de maneira adequada tal fenômeno nas estimativas de nascidos vivos, para citar um exemplo.

Por fim, cabe destacar a complexidade cada vez maior dos processos de estimativa indireta nos últimos anos e, assim, a redução da capacidade de comunicação e de reprodutibilidade dos resultados. Neste sentido, The Guidelines for Accurate and Transparent Health Estimates Reporting (GATHER) (3) representam uma iniciativa louvável para formular diretrizes.

Estas diretrizes devem ser consideradas uma opção para solucionar a falta de dados de saúde confiáveis em determinados contextos. Entretanto, deve se ter em mente suas limitações e consequências para o registro adequado e transparente dos dados.

Porém, é preciso ter sempre em mente as limitações e consequências destas diretrizes para a notificação precisa e transparente dos indicadores de saúde (4).

Parcerias ao nível global, nacional e local devem ser estimuladas para fortalecer os sistemas nacionais de informação em saúde e criar capacidade local para produção, análise e uso de dados e indicadores de saúde. Vale reconhecer o empenho dos organismos internacionais (OMS e outros organismos das Nações Unidas), instituições científicas e governos no sentido de apoiar a melhoria dos sistemas de informação em saúde e da capacidade analítica.

Dispor de indicadores de saúde globais, nacionais e subnacionais (independentemente de sua origem) que sejam válidos é imprescindível, pois estes indicadores servem para definir as prioridades para investimento relacionadas à saúde, facilitar a avaliação do progresso e eficácia das intervenções e ajudar a definir de forma estratégica a cooperação internacional. Por essa razão, para contemplar a necessidade de indicadores de saúde fidedignos, não se pode deixar de usar as melhores evidências disponíveis em um dado momento, mesmo que se reconheça certo grau de inexatidão. Destacam-se algumas destas situações a seguir:

  • se a qualidade dos dados não for minimamente adequada ou não se dispuser de informação ao nível do país;
  • para comprovar a confiabilidade de eventos de interesse como a subnotificação da mortalidade, sobretudo a mortalidade infantil e a mortalidade materna;
  • ao nível global ou regional, por necessidade de usar informação padrão para calcular indicadores; as diferenças quanto à qualidade dos dados e da informação e protocolos adotados pelos sistemas de saúde no que se refere à representatividade populacional, definição de casos, coleta e análise de dados, em diferentes lugares (países) e momentos no tempo podem comprometer sobremaneira a comparabilidade dos indicadores entre países e regiões.

As principais fontes de estimativas estatísticas são: para estimativas demográficas, a Divisão de População das Nações Unidas, Divisão do Censo dos Estados Unidos; para indicadores socioeconômicos e mortalidade materna, o Banco Mundial; para números de óbitos, tabelas de mortalidade e taxas de mortalidade materna, a OMS; para números de óbitos e tabelas de mortalidade, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), Centro Latino-americano e Caribenho de Demografia (CELADE); e as instituições acadêmicas que usam uma ampla variedade de estimativas.

A OPAS, como organismo internacional, usa estimativas demográficas oriundas da Divisão de População das Nações Unidas mais que os censos nacionais dos Estados Membros. Este enfoque possibilita compara dados sobre mortalidade materno-infantil provenientes do Grupo Interagencial para a Estimativa de Mortalidade Infantil das Nações Unidas (IGME, em inglês). Este grupo foi formado em 2004 com o intuito de conformar as estimativas no sistema das Nações Unidas, melhorar os métodos de estimativa da mortalidade infantil, informar sobre o progresso para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento de Milênio (ODM), agora dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), e melhorar a capacidade dos países de elaborar cálculos sobre a mortalidade infantil oportunos que sejam avaliados adequadamente. O IGME é liderado pelo UNICEF e a OMS e compreende também o Banco Mundial e a Divisão de População das Nações Unidas (dentro do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais).