A Telemedicina e a Telessaúde embarcadas no ecossistema de Saúde Digital

Contribuição da Profa. Dra. Ana Estela Haddad, Professora Associada e Coordenadora do Núcleo de Telessaúde e Teleodontologia FOUSP-SAITE / Universidade de São Paulo; e Dr. Luiz Ary Messina, Coordenador nacional da Rede Universitária de Telemedicina Rute, Rede Nacional de Ensino e Pesquisa RNP, presidente da ABTms Associação Brasileira de Telemedicina e Telessaúde.

A telemedicina e a telessaude entraram definitivamente na agenda global e ganharam grande visibilidade a partir do advento da pandemia da COVID-19. Todavia, data de 2005 a Resolution WHA58.28 da WHO preconizando a e-Saúde para fortalecer os sistemas de saúde de seus países membros.Telemedicine and telehealth have definitely entered the global agenda and gained great visibility with the advent of the COVID-19 pandemic. However, the WHO Resolution WHA58.28 dates from 2005, advocating e-Health to strengthen the health systems of its member countries.

No início do milênio, em 2003, foram iniciados projetos de telemedicina e telessaúde entre a União Europeia e a América Latina: Programa @lis Alliance for the Information Society onde destacam-se e-México, T@lemed, eHAS Enlaces Hispano Americano de Salud, HCN Health Care Network e RedClara. A RedClara (Cooperação Latino Americana de Redes Avançadas) é a rede de fibra ótica dedicada à ensino e pesquisa conectando as redes acadêmicas nos países da AL. E-México avançou o Programa Nacional de Telemedicina do México; T@lemed inspirou a criação da RUTE Rede Universitária de Telemedicina sob a coordenação da RNP Rede Nacional de Ensino e Pesquisa, no Brasil, com recursos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI); eHas demonstrou a viabilidade em comunidades na selva sem energia; HCN inspirou o Tele Minas Saúde. Essas iniciativas serviram como embriões e permitiram que grupos de pesquisa, inovação e atenção à saúde adentrassem de forma pioneira na telemedicina e na telessaude.

A partir de 2006, a aproximação no Brasil entre a RUTE, pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação e no Ministério da Saúde, a Secretaria incumbida da formação dos profissionais e da força de trabalho em saúde, contando ainda com o apoio do Ministério da Educação, resultou na articulação entre a RUTE, o Programa Telessaude Brasil Redes, e posteriormente também a Universidade Aberta do SUS (UNASUS). Essas três redes, articuladas em um país de dimensões continentais, e de caráter público, impulsionaram a atuação em rede no setor saúde, incluindo a atenção, a formação, a pesquisa e a gestão em saúde.

A RUTE, uma rede de colaboração científica em saúde, onde toda instituição de saúde pode participar das 3 sessões diárias de dscussão de casos em 50 especialidades da saúde, completa 15 anos em 2021, e está presente em 140 hospitais universitários e de ensino no Brasil.

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A partir da esquerda: Frank Lievens (ISfTeH), Andy Fisher (ISfTeH), Claudio Souza (UFMG), Alexandra Monteiro (UERJ / ABTms), Ana Emilia Figueiredo (UFMA / ABTms), Ana Estela Haddad (USP / ABTms), Yunkap Kwankam ( ISfTeH), Luiz Ary Messina (RNP / ABTms) no 8º CBTms do Rio. O X CBTms Congresso Brasileiro de Telemedicina e Telessaúde, 100% virtual, será um evento inovador em conjunto com a ABTms e a SBIS Sociedade Brasileira de Informática em Saúde e a RNP Rede Nacional de Investigación y Enseñanza entre 22 e 26 de novembro de 2021. (https://forum.rnp.br/)

O Programa Telessaude Brasil foi criado com o objetivo de oferecer aos profissionais da Estratégia de Saúde da Família Atenção primária à saúde), uma segunda opinião, por meio das teleconsultorias / teleinterconsultas, gradualmente ampliado para todo o país. Desafios com a conectividade, o desenvolvimento de plataformas digitais, o estabelecimento de padrões, foram enfrentados. Estudos publicados e o monitoramento do Programa demonstraram que a cada duas teleconsultorias oferecidas, evitou-se o encaminhamento de um paciente para outros serviços. Em média, 60% das teleconsultorias levou a uma mudança na conduta inicialmente planejada, reduzindo custos, em especial com o tratamento fora de domicílio, resultando em maior resolubilidade dos casos.

A incorporação da telessaude na teletriagem, reduziu filas de espera por especialidades. Além de qualificar os atendimentos, a telessaude tornou-se uma estratégia de fortalecimento da atuação em rede – apoiando a referência e contra-referência de paciente - e ampliação do acesso ao atendimento humanizado.

A aproximação destas ações com orientações da OPAS Organização Pan Americana de Saúde e da OMS Organização Mundial da Saúde foi natural e ocorreu ao longo de todo este período. Alguns exemplos são: Projeto BID Bens Públicos Regionais RG-T1509 Protocolos Regionais para Políticas Públicas de Telessaúde na América Latina (2009-2013), eTAG eHealth Technical Advisory Group OMS (2013-2019), Conversaciones en Salud, Estratégia de Telessaúde para países da CPLP, citação da RUTE na Plataforma de Saúde Digital da OMS 2020.

O Programa Telessaude Brasil e a UNASUS foram desenvolvidos por meio de cooperação técnico-científica com a OPAS. De forma inovadora, a biblioteca virtual em saúde do Programa, cujo design de gestão da informação coube à BIREME/OPAS, resultou na criação da Segunda Opinião Formativa, como uma nova forma de fazer a gestão da informação e das evidências em saúde – a partir das dúvidas clínicas dos profissionais atuando na atenção primária à saúde. Em 2011, o Programa foi reconhecido pela OPAS como modelo de sucesso.

Dois novos cabos submarinos privilegiam o ensino e a pesquisa, o primeiro entre a África e as Américas (Luanda-Fortaleza SACS), e BELLA Building Europe Link to Latin America, gerando também na rede regional Géant e nas redes acadêmicas europeias um maior estímulo à atuação das instituições de pesquisa em saúde digital e na colaboração com a América Latina.

A expansão esperada nos cuidados à saúde, a prática das TICs, e a demanda de profissionais capacitados abre caminho para as redes acadêmicas integradas.

Sob coordenação da RedClara e orientação da RNP, foi lançada a RUTE Chile, Colômbia e Equador neste primeiro semestre de 2021.

Nestes 15 anos de dedicação à área, naturalmente passamos por momentos desconcertantes também. Quando fomos convidados em um dia de jogo do Brasil para Brasília, para uma reunião importante mas descobrimos que não nos conheciam, quem convidou não estava e quem representou nem a pauta sabia... Voltamos para o jogo!

A Informática em Saúde já estava em amplo desenvolvimento no mundo. A SBIS Sociedade Brasileira de Informática em Saúde foi criada em 1986. Em 2002 foi fundada a ABTms Associação Brasileira de Telemedicina e Telessaúde. E os passos hoje levam a uma aproximação natural em torno da expansão da Saúde Digital. Em novembro teremos o evento "Desenvolvimento Humano e Saúde Digital em Foco", promovido pela SBIS, ABTms e a RNP.

O mundo vem vivenciando um crescimento expressivo de iniciativas na área de saúde utilizando Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC).

As iniciativas desenvolvidas até aqui criaram as bases para os próximos passos necessários à disrupção digital e cognitiva em curso. Projeta-se a necessidade da cooperação em rede, criar capacidades para os sistemas de saúde e planejamento estratégico sobre as realidades de cada país. Os atuais desafios requerem esforços globais e novas formas de governança nacional, regional, global – trabalho em rede. Os membros de uma rede se enredam em esforços conjuntos, não há nada mais comum do que um cenário pandêmico – heterogeneidade organizada.

Nessa perspectiva, propõe-se que a ação em rede dos diversos stakeholders que integram a cadeia de serviços e sistemas de atenção à saúde, possam dirigir esforços colaborativos no desenvolvimento e fortalecimento do ecossistema de saúde digital.